Crise muda hábitos de consumo e impulsiona inflação de alimentos com poucos nutrientes
Matheus Peçanha, pesquisador do FGV Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas), explica que os alimentos considerados inferiores são sempre mais atingidos pela inflação em momentos de redução da renda das famílias.
“Parte dessa dinâmica de demanda contribui para a aceleração de preço desses bens inferiores e, por mais que eles apesentem uma variação acima da inflação, eles seguem mais baratos do que aqueles bens considerados comuns”, afirma Peçanha.
Fernanda Mansano, economista e professora de Análise de Cenários Econômicos no Ibmec-SP, afirma que o movimento pode ser explicado pelo salto da inflação geral, que diminuiu o poder de compra da população. “O brasileiro passou a consumir alimentos inferiores na comparação com aqueles que têm um valor nutritivo maior, mas que custam mais caro”, avalia.
Ao citar especificamente a possibilidade de substituição do arroz pelo macarrão, Fernanda destaca a influência da valorização do dólar sobre os grãos. “Nós observamos um aumento do preço do arroz e aqueles consumidores com a faixa salarial menor, das classes C e D, são os primeiros a trocar um item por outro de menor valor nutricional”, ressalta ela.
Diante do cenário, Peçanha recorda que o arroz e o feijão também são classificados como bens inferiores, apesar da qualidade nutricional mais abundante, o que alavancou o preço dos itens no ano passado. “Com a superação da seca, as altas foram devolvidas até o estabelecimento da inflação no nível dos alimentos em geral.”
As proteínas mais utilizadas no momento da substituição também figuram como os vilões da inflação neste ano, puxada pelos preços do leite longa vida (+57,42%). Há também um aumento expressivo dos ovos (+12,21%). Por outro lado, as proteínas mais nobres, como o filé-mignon (-3,81%) e a carne de carneiro (-8,43%) ficaram mais baratos nos sete primeiros meses do ano.
De acordo com Fernanda Mansano, a substituição pela carne de frango ou o ovo por proteínas inferiores, com a salsicha, ocorre com a deterioração da situação das famílias mais pobres. “Isso mostra que a situação está se deteriorando quando o consumidor tem que direcionar a alimentação de proteínas por bens muito inferiores”, lamenta.
O cenário adverso contribui para o aumento da insegurança alimentar no Brasil, que passou a atingir 36% da população em 2021, de acordo com a FGV Social. Segundo outro estudo, da Vigisan, 33,1 milhões de brasileiros passam fome no país.
FONTE: R7 (POR ALEXANDRE GARCIA)