Sônia Guajajara assume como a primeira ministra dos Povos Indígenas prometendo “aldear a política”
Em disputada cerimônia ocorrida em 11/01, a líder indígena valoriza a ancestralidade e anuncia sua equipe
A líder indígena Sônia Guajajara assumiu nesta quarta-feira (11) o comando do Ministério dos Povos Indígenas. Em uma cerimônia de posse repleta de simbolismos, Sônia se tornou a primeira mulher indígena a assumir um ministério no Brasil, justamente o primeiro dedicado exclusivamente à formulação de políticas para os mais de 300 diferentes povos indígenas que vivem em território brasileiro.
A criação do novo ministério pelo governo federal vem em um momento importante, depois de uma intensa escalada de ataques aos direitos indígenas nos últimos quatro anos. Os povos indígenas foram dos mais prejudicados pelo clima de impunidade instalado no país durante o governo Bolsonaro, período no qual o desmatamento promovido por invasores quase triplicou em relação aos níveis históricos.
A ministra agradeceu aos diversos defensores ambientais indígenas que foram assassinados nos últimos anos, dentre eles Paulino Guajajara e Ari Uru Eu Wau Wau. Também homenageou o indigenista Bruno Araújo Pereira e o jornalista britânico Dom Phillips – que foram assassinados em uma expedição à região amazônica do Vale do Javari, no Amazonas, em junho de 2022 – e agradeceu ao presidente Lula por reconhecer a força e o papel dos povos indígenas no Brasil, sobretudo neste momento que torna fundamental o reconhecimento do protagonismo dos povos indígenas frente à preservação do meio ambiente e da justiça climática.
Atualmente, cerca de 24% do território amazônico é protegido pelos povos indígenas sendo eles, portanto, os principais guardiões da floresta, aliados fundamentais para evitar que a Amazônia atinja o ponto de não retorno, uma vez que mais de 97% dos territórios indígenas ainda são cobertos por florestas e outras formas de vegetação nativa. A luta para mitigar os efeitos da crise climática e aquecimento da temperatura do planeta passa necessariamente pela proteção desses territórios, o que só será possível com a oferta de políticas adequadas de saúde, educação, transportes, saneamento, comunicações e de desenvolvimento econômico sustentável, justamente o objetivo do novo ministério.
Resgate Ancestral
Em seu discurso, Sonia lembrou do apoio de sua tia, que lhe presenteou, ainda pequena, um colar e um maracá, os quais lhe deram o dom da comunicação e permitiram que ela se tornasse uma grande divulgadora da causa não apenas de seu povo, mas de todos os povos indígenas do Brasil – antes de ser ministra, ela ocupava a coordenação geral da Articulação dos Povos Indígenas no Brasil (APIB). Lembrou também das diversas lideranças indígenas que lutaram antes dela para que finalmente o país superasse o paradigma da tutela e da assimilação, algo fundamental para que agora se pudesse criar o ministério.
O discurso foi acompanhado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que prestigiou a posse realizada em conjunto com Anielle Franco, que assumiu o comando do Ministério da Igualdade Racial. O hino nacional foi cantado no idioma tikuna e em português. No fim do evento, representantes do povo Terena apresentaram a dança da ema e levantaram a nova ministra dos Povos Indígenas para homenageá-la.
A cerimônia ainda ganhou um significado de resistência, por ser realizada em um dos prédios públicos que foram invadidos e vandalizados por milhares de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro no dia 8 de janeiro. A posse estava originalmente marcada para o dia 9, mas foi adiada por conta dos estragos deixados no Palácio do Planalto.
Em seu discurso de posse, Sônia mencionou a resistência secular preta e indígena do Brasil e pontuou sua posse e de Anielle Franco como um ato de coragem, para mostrar que atos antidemocráticos e violentos não vão destruir a democracia. “Não vamos permitir novo golpe no nosso país. Estamos juntos, presidente Lula, para reconstruir a nossa democracia”, disse Sônia.
Durante o evento, a ministra anunciou sua nova equipe (veja ao final) e reprisou a importância da recriação do Conselho Nacional de Política Indigenista, que havia sido desmantelado durante o governo anterior. “As terras indígenas, os territórios habitados por demais povos e comunidades tradicionais, e as unidades de conservação são essenciais para conter o desmatamento no Brasil e para combater a emergência climática enfrentada por toda a humanidade”, afirmou a ministra.
“Sabemos que não será fácil superar 522 anos em quatro. Mas estamos dispostos a fazer desse momento a grande retomada da força ancestral da alma e espírito brasileiros. Nunca mais um Brasil sem nós. Vamos aldear a política”, completou Sônia.
Para a ministra, o conhecimento dos povos e comunidades tradicionais são fundamentais para combater a crise climática. “É preciso que este conhecimento, reconhecido em tratados internacionais, seja valorizado pelo território nacional através de políticas locais que considerem as diversidades.”
Veja a equipe do Ministério dos Povos Indígenas anunciada durante o evento:
Secretário-Executivo – Eloy Terena
Chefe de Gabinete – Jozi Kaingang
Sec. dos Direitos Ambientais e Territoriais Indígenas – Eunice Kerexu
Sec. de Gestão Ambiental e Territorial Indígena – Ceiça Pitaguary
Sec. de Articulação e Promoção de Direitos Indígenas – Juma Xipaia
Assessor Especial – Marcos Xukuru
FONTE: WWF BRASIL