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Crises mudam padrões do tráfico humano e dificultam a identificação das vítimas

Dados sobre redução no número de pessoas traficadas no mundo não indicam uma queda real no crime, mas sim uma maior dificuldade para identificar as vítimas.

Esta é uma das constatações do Relatório Global sobre Tráfico de Pessoas, divulgado nesta terça-feira pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime, Unodc.

Uma vítima de tráfico humano depois de concluir um programa de reintegração

©IOM/S.Desjardins

Uma vítima de tráfico humano depois de concluir um programa de reintegração

Como a pandemia impactou o tráfico de pessoas

Em 2020, houve uma queda de 11% em relação ao ano anterior, impulsionada pelos países de baixa e média renda. Além de reduzir as oportunidades de atuação dos traficantes, a pandemia pode ter enfraquecido também a capacidade das autoridades de detectar as vítimas.

A pesquisadora do Unodc, Claire Healy, explicou à ONU News, de Viena, alguns dos fatores que podem ter influenciado essas estatísticas.

“O número de casos de tráfico para trabalho forçado e o número de casos do tráfico de homens aumentaram um pouco, mas o número de mulheres identificadas como vítimas e o número de casos de exploração sexual diminuíram porque não houve a mesma capacidade. O segundo fator é que a exploração sexual foi mais clandestina durante a pandemia, não teve lugar nos lugares normais, digamos, em que acontecia antes da pandemia, foi mais underground. E o terceiro fator, e isso é a única coisa mais positiva em tudo isso, é que não houve tantas oportunidades para a exploração sexual, para tráfico, para exploração durante a pandemia, também por causa das restrições.”

Brasil, Portugal, Angola e Moçambique

A sétima edição do relatório abrange 141 países e fornece uma visão geral dos padrões e fluxos de tráfico de pessoas em níveis global, regional e nacional, com base em casos de tráfico entre 2017 e 2021.

No Brasil, em 2020, o número registrado desses crimes se manteve como no ano anterior. Já em 2018 houve um aumento de 72% em relação a 2017. Entretanto, o número de suspeitos, presos ou indiciados por tráfico de pessoas caiu 70% em 2020, comparado com 2019.

Em Portugal, a queda de vítimas identificadas de tráfico foi de cerca de 49% em 2020, comparada com o ano anterior. Já a quantidade de suspeitos, presos ou indiciados por tráfico de pessoas caiu 24% de 2020 para 2019.

Entre os países de língua portuguesa na África citados no relatório, Angola teve uma diminuição de 17% nos casos registrados e Moçambique teve um aumento de 42%.

Cabo Verde não teve nenhum caso registrado neste período.

Crianças e mulheres permanecem altamente vulneráveis ao tráfico na Ásia e no Oriente Médio.

© Unicef/Shehzad Noorani

Crianças e mulheres permanecem altamente vulneráveis ao tráfico na Ásia e no Oriente Médio.

Impunidade

Globalmente, o número de condenações por crimes de tráfico também caiu 27% em 2020 em relação ao ano anterior, com quedas maiores no Sul da Ásia, 56%, América Central e Caribe, 54%, e América do Sul, 46%.

Claire Healy alerta que a cada dois anos quando é feito o relatório, sempre há o problema grande da impunidade.

“Piorou bastante durante os últimos dois, três anos, porque houve menos capacidade não só de identificar casos de tráfico de pessoas, mas também de fazer processos criminais contra os autores. Aí, vimos não só pela primeira vez, uma diminuição de identificação de vítimas, mas também uma diminuição de investigações e de condenações dos autores, o que é uma situação muito perturbante, porque realmente as vítimas de tráfico de pessoas não estão tendo acesso a um direito da justiça.”

O relatório mostra ainda que as vítimas, quando são identificadas, escapam dos traficantes por conta própria.

Sociedade civil e agentes da lei

Há mais casos de pessoas que escapam e denunciam às autoridades por sua própria iniciativa, 41%, do que situações em que as vítimas foram localizadas por agentes da lei, 28%, membros da comunidade e sociedade civil, cerca de 11%.

Para o Unodc, isso é especialmente preocupante, considerando que muitas vítimas de tráfico podem não se identificar como tal ou podem ter muito medo de seus exploradores para tentar escapar.

A diretora executiva da agência, Ghada Waly disse que “a ONU e a comunidade de doadores precisam apoiar as autoridades nacionais, principalmente nos países em desenvolvimento, para responder às ameaças do tráfico e para identificar e proteger as vítimas, especialmente em estados de emergência.”

Há mais riscos de tráfico para exploração sexual como forma de violência sexual em conflito nas áreas do extremo norte

PMA/Claire Nevill

Há mais riscos de tráfico para exploração sexual como forma de violência sexual em conflito nas áreas do extremo norte

Impacto dos conflitos no tráfico de pessoas

O relatório também detalha como a guerra e o conflito oferecem oportunidades para os criminosos. Isso mostra que a guerra na Ucrânia está elevando os riscos de tráfico para a população deslocada. A maioria das vítimas de conflitos tem origem e é traficada para países da África e do Oriente Médio.

O estudo mostra níveis mais altos de impunidade na África Subsaariana e no Sul da Ásia. Os países dessas regiões condenam menos traficantes e detectam menos vítimas do que o resto do mundo.

Além disso, as vítimas são identificadas em uma gama mais ampla de países de destino do que as de outras regiões.

Mulheres mais vulneráveis

O relatório também mostra que as vítimas do sexo feminino estão sujeitas a violência física ou extrema nas mãos de traficantes em uma taxa três vezes maior do que os homens, e as crianças são submetidas quase duas vezes mais que os adultos.

As mulheres investigadas por tráfico de pessoas também têm uma probabilidade significativamente maior de serem condenadas do que os homens.

Isso sugere que o sistema de justiça pode discriminar as mulheres e/ou que o papel das mulheres nas redes de tráfico pode aumentar a probabilidade de serem sentenciadas pelo crime.

FONTE: ONU NEWS

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