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Lobby do petróleo patrocinou informações falsas na COP27

Os alertas da comunidade científica sobre o aquecimento global fazem com que governos e empresas em todo o mundo se esforcem para reduzir os impactos ambientais, mas as companhias de combustíveis poluentes, como petróleo, gás e carvão, continuam trabalhando para retardar a transição para matrizes de energias renováveis. O novo relatório Deny, Deceive, Delay, da coalizão Climate Action Against Disinformation (CAAD) mostra como notícias falsas foram espalhadas por empresas ligadas à produção de combustíveis fósseis antes e durante as reuniões da Conferência do Clima da ONU (COP27) em Sharm el Sheikh, no Egito, em novembro de 2022. O documento aponta o gasto das organizações desse setor de aproximadamente US$ 4 milhões em anúncios na Meta, controladora de redes sociais como Facebook e Instagram, com o intuito de espalhar informações falsas e enganosas sobre a crise climática e as necessidades do uso de seus combustíveis.

De acordo com o documento, foram identificados 3.781 anúncios do tipo, postados por 87 páginas nessas redes, sendo a maioria veiculados por um grupo de relações públicas do American Petroleum Institute, gastando entre US$ 3 milhões e US$ 4 milhões. Somente um dos principais produtores de materiais plásticos dos EUA gastou mais de US$ 1 milhão em postagens pagas nas plataformas digitais, com um gasto médio diário de US$ 13 mil. Além disso, conteúdos negacionistas das questões climáticas tiveram um aumento exponencial em diferentes redes desde julho do ano passado, incluindo a hashtag #ClimateScam no Twitter.

Durante a COP27, a desinformação incluía minimizar as preocupações relacionadas à crise climática ou às emissões de gases do efeito estufa, lançar mão da falsa ideia de os combustíveis fósseis serem necessários e confiáveis, bem como trazer engodos às discussões sobre reparações climáticas. Grandes petroleiras anunciaram contribuições para zerar as emissões líquidas de gases do efeito estufa, durante a conferência, mesmo seus portfólios de investimento sendo ainda predominantemente voltados ao petróleo e gás.

Enquanto isso, algumas organizações publicaram anúncios negacionistas sobre a crise climática, alegando que uma “nova pesquisa desmascara a afirmação de consenso de 97% sobre #mudançaclimática”, sem apresentar evidências científicas. Entre as técnicas utilizadas por esses grupos, estão as mensagens com apelos emocionais, citando a crise do custo de vida, guerras culturais e teorias conspiratórias sobre o clima, e a necessidade de combustíveis fósseis. Essas narrativas geraram 267 mil postagens originais produzidas por 139.889 contas e compartilhadas 1.284.969 vezes.

Outro ponto observado pelos pesquisadores foi o comportamento das redes sociais durante a conferência. Um exemplo que chamou a atenção foi a recomendação do Twitter para pesquisas orgânicas sobre clima com o termo “Climate Scam”, utilizado em postagens anti climáticas. Ele continuou sendo recomendado, mesmo após os parceiros da CAAD terem sinalizado o fato à própria plataforma. Essa hashtag continua crescendo, em que pese outras como #CriseClimática e #EmergênciaClimática terem mais atividade e engajamento. “A fonte de sua viralidade é totalmente obscura e enfatiza novamente a necessidade de transparência sobre como e por que plataformas apresentam conteúdo para os usuários”, afirmam os autores do relatório.

As pressões do mercado de combustíveis fósseis sobre a COP27 não se deram apenas pelas redes sociais, mas também pela presença de lobistas durante as reuniões na cidade egípcia de Sharm el Sheikh. Foram 636 representantes na conferência, número 26% maior do que na COP26, que contou com 503. Para se ter uma ideia, a quantidade de lobistas na conferência superou o número de delegados de qualquer país africano, segundo uma análise produzida pelas organizações Global Witness, Corporate Accountability e Corporate Europe Observatory. “Há um aumento da influência da indústria de combustíveis fósseis nas negociações sobre o clima que já estão repletas de acusações de censura da sociedade civil e influência corporativa”, afirmaram, em nota.

Para o próximo evento, a COP28, que ocorrerá em Dubai, Emirados Árabes, no final deste ano, terá pela primeira vez como presidente da conferência o CEO de uma petroleira. Sultan Ahmed al Jaber preside a estatal do petróleo dos Emirados Árabes desde 2016. Para o chefe de estratégia política global da Climate Action Network International, Harjeet Singh, a nomeação de al Jaber é “um conflito de interesses ultrajante”. “A ameaça constante dos lobistas dos combustíveis fósseis nas negociações climáticas da ONU sempre prejudicou os resultados das conferências climáticas. Esta situação agora atingiu um nível perigoso e sem precedentes.”

Investidas e pressões do mercado de combustíveis fósseis não são novidade. O lobby da indústria tenta intervir em políticas de Estado para manter apoios fiscais e retardar a transição de combustíveis poluentes para fontes limpas de energia. Um exemplo disso é o que tem feito a indústria de petróleo e gás em um amplo ataque contra um projeto de lei nos Estados Unidos que retirava incentivos fiscais para combustíveis fósseis, uma das responsáveis pelas mudanças climáticas. O American Petroleum Institute, maior grupo comercial de petróleo e gás cujos membros são gigantes petroleiras, desempenha um papel fundamental na pressão por isenções fiscais para o setor no país. Somente no primeiro semestre de 2021, o grupo gastou mais de US$ 2 milhões com lobby no Congresso americano apenas com questões sobre impostos, além de uma campanha milionária na televisão em oposição a várias medidas previstas no pacote de reconciliação preparado pelo Legislativo.

Não só em mídia televisiva, mas também em redes sociais. Segundo o InfluenceMap, um think tank que rastreia a influência de empresas na formação de políticas, o grupo gastou quase meio milhão de dólares em anúncios no Facebook com ataques a um projeto de resolução orçamentária aprovado no Senado. As postagens foram direcionadas a pelo menos 286 membros do Congresso, tendo sido visto mais de 21 milhões de vezes. Os dados ainda mostram que a Exxon Mobil, maior produtora de petróleo do país, gastou cerca de US$ 1,6 milhão em anúncios políticos no mesmo período.

Campanhas como essas têm uma longa história de bloqueios na política climática. De acordo com o pesquisador de Stanford e cofundador da Climate Social Science Network, Benjamin Franta, em entrevista ao jornal The New York Times, esse grupo lobista “foi um dos primeiros na indústria a minimizar a ameaça da mudança climática e promover mais expansão de combustível fóssil”.

FONTE: WWF BRASIL

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