EcologiaVariedades

Coleta de sementes pode gerar novas oportunidades de renda em MS

Por Douglas Santos, de Nioaque (MS) 

A coleta de sementes nativas para a restauração das cabeceiras do Pantanal, região fundamental para a resiliência hídrica do bioma, é uma alternativa de trabalho e renda para quem vive em Nioaque, município de cerca de 14 mil habitantes no oeste de Mato Grosso do Sul, e áreas vizinhas. É uma atividade que requer conhecimento da flora local e de técnicas de manejo das espécies que crescem no Estado. Por isso, em parceria com a empresa VerdeNovo e o Centro de Produção, Pesquisa e Capacitação do Cerrado (Ceppec), o WWF-Brasil reuniu, em outubro de 2022, mais de 20 pessoas no assentamento Andalúcia para uma oficina de capacitação em coleta, beneficiamento e armazenamento de sementes. 

O público foi diverso, com pessoas que já atuam na cadeia do baru, mas buscam novas oportunidades, ou que procuram uma nova fonte de renda. A oficina, conduzida pela VerdeNovo, que é especializada em restauração no bioma, ajudou os coletores a identificar as famílias botânicas e os tipos de sementes presentes na região. Já que há diferentes formas de coleta, armazenamento e beneficiamento – e o sucesso da restauração depende do emprego das técnicas apropriadas para cada uma delas. Ou seja: o manejo correto em todas as fases da atividade preserva a capacidade de germinação das sementes, matéria-prima do processo de recuperação de paisagens degradadas. 

O avanço descontrolado do desmatamento no Cerrado tem prejudicado as nascentes, reduzindo a vazão de água e impactando não só a biodiversidade local, mas também o modo de vida e o bem-estar das populações que vivem e dependem dos recursos naturais da região. “A relação entre água e ambientes equilibrados é direta. Precisamos de nascentes protegidas com vegetação para que o ciclo hídrico não seja quebrado, prejudicando toda a cadeia de abastecimento”, salienta Veronica Maioli, especialista em Conservação do WWF-Brasil. 

Mulheres na restauração 

A restauração é uma atividade que traz renda para diversas comunidades e tem grande potencial de crescimento no Brasil. Exercida em grande parte por mulheres, a coleta de sementes, que é uma das etapas para a recuperação de áreas degradadas, contribui diretamente para o avanço da qualidade de vida das famílias e para a valorização do conhecimento local e empoderamento feminino.  

“Para nós, encaixou como uma luva. Pensar que você hoje está aqui e vai poder contribuir para que as próximas gerações desfrutem de uma natureza equilibrada e, ainda por cima, conseguir tirar o seu sustento com um ambiente bom para viver mudou a vida da gente”, afirma Rosana Claudina da Costa Sampaio, agricultora e extrativista, que atua na coleta de sementes há mais de 15 anos. Ela conta que, a partir das técnicas aprendidas na oficina, vai conseguir reduzir as perdas de sementes e melhorar a qualidade o material coletado.   

Já Alda Lina de Barros, envolvida na atividade desde 2018, relata que criou um grupo de mulheres na comunidade para a coleta de sementes e que os ensinamentos, em especial aqueles referentes à identificação de novas espécies, serão compartilhados com o grupo. “Nós nos juntamos e saímos para o campo, nos unimos e ficamos mais fortes”, salienta. “Conquistamos coisas que nem sonhávamos, pois não tínhamos renda. Hoje, muitas meninas e até eu mesma botamos muita coisa para dentro da nossa casa, coisas que precisávamos e que não teríamos como sem as sementes. Então, a gente ajuda a natureza e ela nos ajuda de volta. Isso é muito gratificante para mim.” 

A coleta de sementes é uma atividade que envolve conhecimentos técnicos e tradicionais. A identificação dos tipos de sementes, períodos de florada e formas de beneficiamento são partes do processo. “Nosso objetivo é proporcionar vivência, troca de experiência entre essas pessoas sobre as técnicas de coleta e beneficiamento. Queremos ajudar a refinar os olhares de uma forma em que os coletores possam se integrar com o ambiente em que vivem para que a atividade seja desenvolvida de maneira natural, respeitando pessoas e natureza”, afirma Bárbara Pachêco, CEO da VerdeNovo. 

A relação das coletoras com as sementes vai além do trabalho, pois um sentimento comum entre elas é de responsabilidade na conservação do meio ambiente. “Minha missão é fazer com que as pessoas entendam que a gente precisa passar pela porta da natureza. Sem isso não teremos futuro, não teremos amanhã”, destaca Rosana, que também é presidente do Ceppec. Alda faz coro. “Eu vivo das sementes. E semente é vida! Ela constrói uma floresta inteira e a palavra-chave para este trabalho é vida. O retorno dela para nós é incalculável”. 

Depois de coletadas e beneficiadas, as sementes são utilizadas em atividades de restauração conduzidas pela ARCP (Associação de Recuperação, Conservação e Preservação da Bacia do Guariroba (ARCP), que atua na região desde 1996.  

Rosana lembra que quando chegou ao Andalúcia não havia uma sombra sequer. “Quando sortearam os lotes do assentamento eu sonhei que teríamos água depois da terceira pedra. Quando chegamos era tudo seco, nada de água e vi um pequeno pé de embaúba. O tronco era mais fino que um dedo. Mas foi ali mesmo, depois da terceira pedra, com seis metros de escavação, que começou a brotar água do poço”, lembra. 

Ela recorda que sempre repetia para o marido que não precisariam derrubar árvores para produzir. “Depois de um tempo, vimos um buraco de tatu com um pouco de água, pensamos que seria de chuva. Mas, não… o tatu fez um buraco e a água apareceu ali. Então, cercamos aquele buraco e, com o tempo, as árvores foram voltando e o buraco foi ficando maior. Aos poucos, a água começou a correr e fomos isolando a área para o gado não entrar”, salienta Rosana, acrescentando que hoje o cenário é diferente. “A nascente está enorme, com o curso d’agua correndo o ano todo que forma um brejo. A Prefeitura precisou até reformar a estrada, construindo uma canalização para a água correr por baixo”. 

A experiência de sucesso da propriedade de Rosana inspirou outras dezenas de pessoas que hoje protegem suas nascentes dentro do assentamento Andalúcia.  

FONTE : WWF BRASIL

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *