‘O poder que dei para a Marlene Mattos me aprisionou’, diz Xuxa
Maria da Graça Xuxa Meneghel completou 60 anos nesta segunda-feira (27), e a festa foi em um cruzeiro no navio MSC Fantasia, que reuniu fãs, família e amigos. Foi, na verdade, uma viagem no tempo, com uma decoração marcada por figurinos e cenários inspirados no Xou da Xuxa, programa dos anos 1980 que marcou época na TV brasileira, e até em hits como Lua de Cristal.
A festa teve direito ao tradicional “parabéns a você”, bolo e pessoas queridas, como o ator e cantor Junno Andrade, companheiro de Xuxa há dez anos, e Sasha, filha da apresentadora, acompanhada do namorado, João Figueiredo.
Há um mês, Xuxa conversou com o Estadão. Foi um papo longo em que sobraram momentos não publicados, mas revelados aqui.
Você tem uma longa vida artística, pois começou cedo. Como foi evitar que sua imagem televisiva influenciasse a pessoal? Ou seja, como foi construir a noção de limite entre a vida privada e a pública?
Na realidade, não fui preparada. Comecei a trabalhar com 16 anos e achei que iria parar aos 18 ou 20 anos no máximo como modelo para estudar veterinária. Mas, aos 20 anos, entrei na televisão, aos 23 fui convidada para ir para a Globo e aí minha vida virou de cabeça pra baixo, porque não tinha como separar a vida pública da vida privada.
Eu trabalhava de terça a domingo e, com isso, não tinha como não juntar as coisas. As pessoas que trabalhavam comigo acabavam virando minha família, porque eu ficava mais com elas do que a minha própria família. Elas acabavam me conhecendo muito mais: eu me tornava uma nova pessoa na frente de quem trabalhava comigo.
O que aconteceu foi que eu dei poderes — não de uma hora para outra — principalmente para minha diretora, minha empresária, minha produtora e amiga [Marlene Mattos]. Esse poder me aprisionou e me tirou a liberdade de ter uma vida íntima, uma vida privada por muito tempo. Isso, sim, foi um preço muito alto e que não tive como separar infelizmente, pois eu dei esse poder e para tirar só aconteceu com nossa separação. Aí, sim, percebi que é possível separar a vida profissional da pessoal. Hoje sei separar, sei ser mãe, sei ser namorada, mulher e também sei ser a profissional.
Você inaugurou uma fórmula de programa de auditório para crianças no Brasil. Todas que vieram depois eram inevitavelmente comparadas a você. Como você vê isso?
Primeiro, não imaginei aquele estilo de programa em algo que poderia se transformar no sucesso que se tornou. É inevitável você ver alguém que faz sucesso e não tentar beber um pouco dessa água. Digo isso porque eu via Michael Jackson e queria copiar a roupa dele, via os clipes da Madonna e queria copiar as caras e bocas que ela fez para colocar nos meus, eu via pessoas que estavam fazendo sucesso lá fora e queria colocar coreografias nos meus shows e clipes. É inevitável: quando alguém faz sucesso, outros vão querer se espelhar ou copiar.
A gente só copia, ou só curte, ou só quer imitar ou só quer ser parecido ou igual (escolha a palavra que achar melhor) quando você gosta da pessoa. Então, eu acho que essas pessoas que vieram, as outras apresentadoras são ou foram pessoas que me admiravam ou admiravam o que eu estava fazendo. Então, não tem como, de maneira nenhuma, em nenhum momento da minha vida eu vou chegar e dizer “A Fulana me imitou!”.
Às vezes, me incomodava uma coisinha só. É que, às vezes, eu estudava, ralava, viajava, ia lá pra fora e trazia várias ideias, como uma tiara de sol que inventei de colocar na cabeça para fazer mais cabelo, já que eu sempre tive pouco. Angélica tinha muito cabelo, a Mara também, então, eu pensava: como todo tem muito cabelo, vou fazer algo para ficar bacana.
Só que, depois de uma semana, elas também estavam com uma tiara. Foi quando pensei: “Puxa vida! Eu fazia porque eu tinha necessidade, e elas não tinham essa necessidade, já que elas tinham cabelos lindos e têm cabelos lindos até hoje!”.
Isso acontece com música. Você conversa com músicos sobre, por exemplo, os Beatles. Quem nunca bebeu daquela fonte? Quem nunca ouviu aquela guitarra, aquele estilo, aquelas letras e não tentou fazer do seu jeito, fazer não digo parecido, mas seguir pelo mesmo caminho?
De que forma a maternidade mudou sua forma de lidar com as crianças em seu programa?
A maternidade mudou meu modo de agir com os pais, não com as crianças. Eu continuava amando, respeitando e querendo estar do lado delas, sendo apaixonada pelo cheiro delas, os gritinhos, a energia e a vontade de ficar. Faria qualquer coisa, trocaria qualquer coisa para ficar do lado delas.
Claro que, quando tive minha filha, comecei a aprender muito com a Sasha, e querer levar as coisas que estava aprendendo em casa para o convívio com as crianças. Sabe, levando minha experiência de mãe para meu trabalho. Foi por isso que o XSPB aconteceu: naquela época, só tinha programas em inglês, não tinha nada, nem VHS (era a época do videocassete), só a televisão. Então, trazer o XSPB foi para resolver uma necessidade que eu precisava resolver com a Sasha e não tinha aqui.
A minha maior mudança foi porque comecei a entender muito mais os pais. Antes, eu não tinha muito saco, eu olhava para um pai desesperado gritando “Xuxa! Olha pro meu filho!”, “Pega aqui meu filho, beija, tira foto!”.
Às vezes, a criança era tímida, não queria, mas a mãe gritava, o pai chorava e a criança não. Eu achava aquilo um exagero. Quando virei mãe, entendi por completo! Você faz o que tiver que fazer pelo seu filho. Você corre atrás do Mickey, da Minnie, do Barney, da apresentadora X, Y, Z e paga o mico que for para seu filho tirar uma foto, ser feliz ao lado do ídolo dele, então comecei olhar para eles de uma forma diferente. Quando começavam a gritar, eu já falava “Calma, eu estou aqui, eu vou tirar foto com todos eles, não precisa gritar, está tudo certo”.
Aí eles respiravam. Comecei a me imaginar no lugar deles — eu faria muito mais pela Sasha. Eu até pensava “Tá gritando pouco”, eu faria muito mais, pagaria muito mais mico se minha filha quisesse. Então, olhei para os pais que faziam tudo pelos seus filhos e eu não sacava isso antes de ser mãe. Acho que tive mais respeito, mais carinho e até admiração por eles. Cara, é isso. Aprendi, levei um tapa na cara bonito. E foi só quando virei mãe da Sasha é que aprendi.
FONTE: R7