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Reabilitação de áreas degradadas é solução para o desmatamento

Soluções para o desmatamento e ganhos produtivos para o agronegócio. Esses são dois exemplos do potencial que a reabilitação de áreas degradadas tem no Brasil. De acordo com o projeto MapBiomas, a maior parte dos mais de 154 milhões de hectares de pastagens que existem atualmente no país, poderia ser direcionada para o aumento da produtividade agropecuária, ou seja, sem a necessidade de abrir novas áreas de vegetação nativa. 

Apenas no Cerrado, como mostra uma série de estudos do Grupo de Trabalho de Reabilitação de Áreas Degradadas no bioma (GTPastagens), do qual o WWF-Brasil faz parte, há 5,6 milhões de hectares de pastagens degradadas com potencial econômico para intensificação da pecuária de corte; 4,3 milhões de hectares para a pecuária de leite; e 5 milhões de hectares para a soja. Há também mais de 10 milhões de hectares com potencial para Sistemas Integrados, como é o caso da Integração Lavoura, Pecuária e Floresta (ILPF), e 2,5 milhões de hectares para Sistemas Agroflorestais (SAFs). 

E é justamente no Cerrado, em Mato Grosso do Sul, o quinto Estado com o maior rebanho bovino do país, que encontramos exemplos concretos de que não é preciso desmatar para produzir mais. “Temos uma área para trabalhar. Quando a gente conseguir intensificar a produção, onde eu conseguia colocar meia ou uma unidade animal, por exemplo, eu vou conseguir colocar duas ou três. Vamos produzir muito mais na mesma área e não precisamos abrir mais nada, não tem que derrubar um pé de árvore e não tem que entrar nas reservas”, afirma Walter Thaler, médico veterinário e produtor rural. 

Thaler é filho de produtores, de uma família que está presente na região da Bacia do Guariroba, em Campo Grande, desde os anos 1990. A propriedade, que realiza atividades de pecuária de corte, hoje está em processo de reabilitação, ou seja, trabalhando para devolver e aumentar a produtividade em áreas que já foram exploradas. Com os pés na terra desde criança, Thaler compreende a conexão que o produtor tem com a natureza e a importância de dar continuidade aos negócios dos pais, porém se adequando às novas tendências que unem produção e ganhos financeiros com a conservação da natureza. 

“Eu sou desse meio, minha família veio da terra e sempre tive isso no sangue. Não tem o que eu goste mais, o que eu saiba mais do que estar no campo. E eu acho que essa sucessão familiar e essa continuidade é muito importante. Ainda mais atualmente, pois temos muita coisa para avançar em tecnologia, conservação e incrementos produtivos”, pontua. 

A Área de Proteção Ambiental dos Mananciais do Córrego Guariroba (APA do Guariroba), onde a propriedade de Thaler está localizada, é a principal responsável pelo abastecimento público de água para a capital sul-mato-grossense. Por isso, com o propósito de proteger a região, produtores rurais criaram em 1996 a Associação de Recuperação, Conservação e Preservação da Bacia do Guariroba (ARCP), que é composta atualmente por 67 membros, a maioria pecuaristas de corte e alguns silvicultores e piscicultores, todos com o desejo em comum de conservar a APA.  

Entre pastos e criações de gado, há na região diversas espécies de fauna e flora. Isso porque produtores do Guariroba se mobilizaram para realizar práticas de reabilitação de áreas degradadas e recuperação de nascentes, entre outras ações de conservação da natureza. “Começamos a conversar mais com o Ministério Público, a Secretaria de Meio Ambiente e a prefeitura para entender o que precisava ser feito na Bacia. Participamos, inclusive, da elaboração do plano de manejo da APA”, explica Claudinei Pecois, presidente da ARCP. 

A importância de incentivos 

A associação também apoia e tem parte dos produtores rurais inscritos no programa de Pagamentos por Serviços Ambientais (PSA) municipal, chamado “Manancial Vivo”, que é um mecanismo de incentivo financeiro que recompensa proprietários que preservam ou recuperam ecossistemas e prestam serviços ambientais para a sociedade, como a conservação da biodiversidade, a manutenção da qualidade da água e do solo, a redução de emissões de gases de efeito estufa, entre outros. 

A propriedade de Thaler faz parte do programa, que tem apoio do WWF-Brasil para incentivar a reabilitação de pastagens e fornecer assistência técnica no Estado. Para ele, os produtores estão em busca de caminhos para evitar abrir novas áreas de vegetação nativa, mas ainda há desafios. “Sabemos que temos que adotar técnicas de conservação e recuperação de áreas degradadas para que tenhamos níveis produtivos satisfatórios. Os produtores tentam fazer o certo, mas muitas vezes não têm instrução ou recursos”, diz. 

Thaler reconhece a importância de conservar o Cerrado, pois já percebe os impactos da destruição. De acordo com ele, gerações mais antigas, como de seus pais e avós, contam que as estações de seca e de chuva eram muito bem determinadas no passado e, com isso, os produtores conseguiam se programar melhor. “Hoje não podemos adotar as mesmas práticas porque o clima mudou muito, está muito incerto e instável para nós”, salienta. 

Metas climáticas e desmatamento 

A conversão de ecossistemas para dar espaço às cadeias produtivas da pecuária, soja e óleo de palma são responsáveis por 40% a 50% das emissões da categoria mudanças de uso da terra para finalidades agropecuárias e de 9% a 12% das emissões totais dos sistemas alimentares, aponta um estudo do WWF-Brasil. Já a conversão da vegetação nativa apenas para pastagens responde por um quinto da pegada total de carbono da pecuária. De acordo com esse mesmo trabalho, as metas climáticas só poderão ser alcançadas com a eliminação do desmatamento. Por outro lado, uma nota técnica mostra que o agronegócio também perde com a destruição, pois o desmatamento aumenta os custos do setor.  

No Cerrado, a taxa anual de desmatamento em 2022 foi de 10.689 km², segundo o PRODES Cerrado, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Número recorde nos últimos sete anos e que representa um salto de 25% quando comparado à taxa de desmatamento do ano anterior. Entre as principais atividades responsáveis pelo desmatamento no bioma estão a produção de gado e soja. Até 2021, a agropecuária ocupava mais de 40% do Cerrado, conforme o MapBiomas. 

Outra experiência na Bacia do Guariroba 

Ainda na Bacia do Guariroba, em outra propriedade produtora de gado, o administrador da fazenda Adriano de Jesus Melo, que trabalha há mais de 20 anos na atividade, conta sobre o antes e depois da experiência. “A fazenda era bem degradada, era muito mais difícil. Estava meio abandonada, mas depois que chegou o programa ela ficou viva. Através do PSA, conseguimos plantar e recuperar”, afirma.  

Para ele, é possível produzir e preservar a natureza. Melo já consegue, inclusive, observar os resultados. “A conservação do meio ambiente é muito importante. Se não preservarmos, não teremos futuro para os filhos e os netos. Depois que começamos a preservar, a água começou a aumentar e os bichos voltaram. É uma satisfação enorme poder fazer parte dessa natureza”, salienta. 

“A abertura de novas áreas para a produção de alimentos é um modelo insustentável em longo prazo”, destaca Laís Cunha, analista de Conservação do WWF-Brasil. “A reabilitação de áreas degradadas é importante não apenas para o produtor, mas também para toda a região onde ele está inserido. Quando temos uma área improdutiva, além de perder um recurso natural de importância inestimável, também deixamos de proteger e gerar serviços ecossistêmicos que são essenciais para a vida no território”. 

Produtores do Guariroba se mobilizaram para realizar práticas de reabilitação de áreas degradadas e recuperação de nascentes.

FONTE: WWF BRASIL

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