Em noite de ‘boiadas’, Congresso avança em direção à destruição do meio ambiente e dos povos indígenas
Apenas em um dia, o Congresso conseguiu avançar em três frentes na agenda anti ambiental. Na iminência do julgamento do Supremo Tribunal Federal sobre marco temporal para a demarcação das terras indígenas, a Câmara dos Deputados aprovou urgência para o Projeto de Lei 490/2007, sobre o mesmo tema. A Mata Atlântica entrou na berlinda com a aprovação da MP 1150, que abre a possibilidade de mais desmatamento. E os ministérios do Meio Ambiente e dos Povos Indígenas foram esvaziados com a retirada de importantes ferramentas de governança e gestão.
O WWF-Brasil entende que esse movimento evidencia um retrocesso do Congresso, que insiste em uma agenda ultrapassada que pode colocar o Brasil à margem do desenvolvimento mundial. Aparentemente, os congressistas ainda não perceberam a chance do Brasil liderar a pauta mundial em questões socioambientais. No caso da base aliada, os votos dados contrariam a proposta governamental que foi eleita perante o Brasil e o mundo, de fortalecer a área socioambiental.
PL 490/2007
Foi aprovado para tramitar em regime de urgência o PL 490/2007 que considera a constituição de 1988 como marco temporal para a demarcação de terras indígenas. Se aprovado, pode representar uma perda de 63% de terras indígenas demarcadas ou em processo de demarcação. A iniciativa abre a possibilidade de rever os limites de terras cujos processos demarcatórios já foram finalizados, o que levará não apenas à estagnação no tamanho de terras oficialmente reconhecidas, mas também à diminuição de algumas. Esse processo pode gerar grande insegurança jurídicas e impasses jurídicos que favorecem os conflitos fundiários.
O WWF-Brasil repudia essa iniciativa do Congresso, tanto pelo impacto sobre os povos indígenas, como pela crise institucional que ela engendra, uma vez que a votação conflita com o julgamento do tema pelo Supremo Tribunal Federal, marcado para o dia 7/6. Trata-se, portanto, de uma clara – e desnecessária – tentativa de confrontar o STF.
MP 1154/2023
Na prática, essa medida provisória esvazia os ministérios do Meio Ambiente e Mudança do Clima e dos Povos Indígenas. E assim retomam o mesmo papel que tinham no Governo anterior. Ou seja, o desmonte ambiental ocorrido nos últimos anos segue como antes, a depender do Congresso Nacional.
O assunto deve seguir para votação no Senado. Mais uma vez os rumos do futuro ambiental estão na mão do Congresso Nacional, que precisa avaliar quem sai ganhando com o esvaziamento das pastas. O Governo, bem como seus aliados precisam se movimentar para que a imagem do Brasil não caia no descrédito internacional.
Confira as mudanças mais relevantes que a versão aprovada da MP propõe: :
- Saída do Cadastro Ambiental Rural (CAR) do MMAMC: , instrumento importante de monitoramento e gestão ambiental seria transferido para o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos. Isso cria dificuldades no uso dos dados e na gestão do sistema, afetando a agenda de regularização ambiental de propriedades rurais no país.
- Demarcação de terras indígenas sai do MPI: a transferência da demarcação de terras indígenas para o Ministério da Justiça e Segurança Pública, esvazia os poderes desse novo ministério.
- Gestão ambiental sai do MMAMC: A transferência da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) e do Sistema Nacional de Gerenciamento e Gestão de Recursos Hídricos (SIGRH) do MMA para o Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional, enfraquece a integração da política de recursos hídricos com a ambiental, algo urgente.
A mudança da Gestão de Resíduos Sólidos do MMA para o Ministério das Cidades e a transferência do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento para o Ministério das Cidades retira o poder de ações estratégicas da pasta.
MP 1150/2022
A Medida Provisória 1150 foi aprovada ontem (24) com vários “jabutis” que ameaçam o futuro da Mata Atlântica. O texto original visava prorrogar o prazo de adesão dos produtores rurais ao Programa de Regularização Ambiental (PRA), mas a versão aprovada vai muito além, fragilizando legislações que protegem esse bioma, abrindo a possibilidade de desmatamento em áreas de risco e desprotegem Unidades de Conservação (UCs).
O texto já havia sido modificado pelo Senado que, na ocasião, retirou todos os dispositivos alheios ao tema da MP, mas a Câmara dos Deputados rejeitou o texto e retomou os jabutis, deixando o impasse das duas casas para decisão do Presidente da República que pode aprovar ou rejeitar o texto. Por isso, o WWF-Brasil solicita o veto ao texto apresentado, que terá a chance de reafirmar para o Brasil e para o mundo o seu compromisso com a agenda socioambiental.
Aspectos mais problemáticos do projeto aprovado pela Câmara dos Deputados:
- Adiamento da data limite para inscrição no CAR: prorroga pela sexta vez o prazo para inscrição no CAR a fim de que o proprietário ou possuidor possa gozar de benefícios quando de sua adesão ao PRA;
- Criação de obstáculos para adesão ao PRA: vincula a adesão ao PRA a um custoso processo de análise e validação de informações, o que pode atrasar ainda mais a implantação do programa, já atrasada em 10 anos;
- Retirada de proteção à Mata Atlântica: altera diversos dispositivos da Lei da Mata Atlântica (Lei Federal 11.428/06), abrindo espaço para um aumento no desmatamento da vegetação mais bem preservada (primária e secundária) desse bioma, que é o mais destruído do país; reduzas salvaguardas para a ocupação de Áreas de Preservação Permanente urbanas, induzindo a ocupação de áreas de risco; diminui, arbitrariamente, as Zonas de Amortecimento de Unidades de Conservação que estejam próximas a áreas urbanas, debilitando a utilidade desse instrumento legal.
FONTE: WWF BRASIL