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Cerca de 30 mil hectares foram mobilizados para restauração na Bacia do Doce 

Trabalho realizado na Mata Atlântica beneficia a natureza e a população de Minas Gerais e do Espírito SantoUm programa apoiado pelo WWF-Brasil conseguiu, ao longo dos últimos cinco anos, a adesão de aproximadamente mil proprietários de Áreas de Preservação Permanente (APPs) e de áreas de recarga hídrica no Espírito Santo e em Minas Gerais para a recuperação de cerca de 30 mil hectares de Mata Atlântica, o equivalente a quase o tamanho de Belo Horizonte (MG) ou a três vezes o território de Vitória, a capital capixaba.  

“Damos suporte para a Fundação Renova na governança dos seus trabalhos de restauração florestal na Bacia do Doce, mobilizando produtores rurais para que sejam alcançadas as metas estabelecidas nas cláusulas 161 e 163 do Termo de Transação e Ajustamento de Conduta (TTAC), que preveem a recuperação de 40 mil hectares de APP e áreas de recarga hídrica e de 5 mil nascentes na região em até 10 anos”, explica Leda Fontelles da Silva Tavares, especialista em Conservação do WWF-Brasil.  

O TTAC foi firmado pelas empresas Samarco, Vale e BHP com dezenas de entidades, entre elas órgãos federais como o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), o ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade) e a ANA (Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico), além de órgãos estaduais e municipais, em decorrência do rompimento da barragem de Fundão, no município de Mariana (MG), em 5 de novembro de2015.  

“As ações de restauração florestal da Renova estão estruturadas em dois programas compensatórios: o PG 26, para a recuperação de 40 mil hectares de APP e áreas de recarga hídrica, e o PG 27, que estabelece a restauração de 5 mil nascentes na Bacia do Rio Doce”, acrescenta Leda. “Os programas com os quais o WWF-Brasil trabalha têm a função de compensar o dano ambiental causado na bacia. Já os programas reparatórios, com os quais não temos relação, estão focados na recuperação dos impactos causados diretamente pelo rompimento da barragem de Fundão.”  

As áreas em processo de restauração estão localizadas em seis sub-bacias hidrográficas prioritárias. Três delas em Minas Gerais (Suaçuí, Manhuaçu e Piranga) e três no Espírito Santo (Pontões & Lagoas, Guandu e Santa Maria). A seleção desses territórios foi resultado de um estudo promovido pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) em parceria com a Universidade Federal de Viçosa (UFV), que considerou o fato de as sub-bacias serem mananciais alternativos para o abastecimento hídrico.  

A identificação da necessidade de recuperar mananciais alternativos partiu do Comitê Interfederativo (CIF). Quanto às nascentes, a indicação dos locais para a execução das ações ficou a cargo do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Doce (CBH Doce).  

Durante a primeira fase dos trabalhos, entre maio de 2018 e janeiro de 2022, cerca de 20 mil hectares de APPs, áreas de recarga hídrica e nascentes passaram a fazer parte do projeto. Outros 8 mil hectares foram mobilizados entre janeiro e junho deste ano, quando começou a segunda etapa, salienta Leda.  

Agroflorestas e biodiversidade  

Os trabalhos realizados pelo WWF-Brasil em parceria com a Renova também buscaram estimular a restauração com geração de renda, por meio da implementação de Sistemas Agroflorestais, os SAFs. Para fomentar esse modelo que une viabilidade financeira e preservação ambiental, foi promovido o “Concurso Ideias Renovadoras: Plantando Árvores e Colhendo Alimentos na Bacia do Rio Doce”, no qual participaram, na fase 1 da seleção, 127 iniciativas de SAFs de todo o Brasil.  

O estímulo ocorreu por meio da seleção de projetos vencedores do concurso dentro e fora da Bacia do Rio Doce e também por intermédio da elaboração de novos arranjos de SAF específicos para a Bacia do Rio Doce.  

Os jurados selecionaram como vencedores três SAFs da Bacia do Rio Doce e outros dois de fora dessa área, além de concederem duas menções honrosas. “Na segunda fase do concurso, foram estruturados sete arranjos de SAF específicos para a Bacia do Rio Doce, visando a atender aos diversos cenários existentes na bacia”, completa Leda.  

Atuação com outras organizações  

No que se refere ao trabalho de estímulo ao engajamento dos produtores, os resultados alcançados são fruto da ação de diversas organizações, não apenas do WWF-Brasil. Uma das primeiras famílias a aderir às melhorias propostas, por exemplo, reflorestou 11 hectares, o que equivale a 11 campos de futebol.  

Com as mudas fornecidas, o casal Mário Francisco de Assis e Maria das Mercedes Oliveira de Assis formou um cinturão verde em torno de sua fazenda, cuja área recebeu cercamento para proteção das matas nativas graças à mobilização feita pelo projeto.  

Moradores de Periquito (MG), Mário e Maria celebram as mudanças. A água, antes escassa, brota das nascentes recuperadas. “Quando cheguei aqui, não tinha água nem para tomar banho. Hoje eu não vejo mais o fundo da lagoa rachado. Vejo água”, diz ele.  

Coleta de sementes como fonte de renda  

Nesse grupo potente está também a Rede de Sementes, organização que vem empoderando mulheres no entorno do Rio Doce. Um dos locais beneficiados é o assentamento do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) Ulisses Oliveira, em Governador Valadares (MG), onde vivem Lúcia Martins, de 68 anos, e Maria das Dores, de 67, para quem a coleta de sementes nativas virou fonte de renda. A iniciativa também faz parte da vida da ambientalista Alessandra Pereira, de 43 anos, e da proprietária rural Creusa Madeira, de 38. Quatro mulheres, quatro histórias de transformação.  

As sementes recolhidas por elas vão para o plantio, com o objetivo de fortalecer as ações de recuperação de nascentes e áreas de recarga hídrica. Sementes viram mudas, e mudas viram árvores. “Estou ajudando a fazer outras regiões, como a Mata Atlântica, florescerem de novo com as sementes que recolho”, afirma Creusa.  

Em outubro de 2022, a Rede iniciou o segundo ciclo de coleta, retirando também 309 quilos de sementes manejadas por indígenas do povo Pataxó da aldeia Geru Tucunã, no Parque Estadual do Rio Corrente, em Açucena (MG). Com isso, passou de uma tonelada o volume de sementes coletadas pelos Pataxó ao longo do projeto.  

“Foi um estímulo para o sustento das famílias e também uma maneira de estar conectado com a natureza. A área é muito grande, e isso trouxe uma responsabilidade maior para nós, de estar levando para o próximo o quão importante é ele fazer a parte dele no cuidar da Mãe Terra”, afirma Natália Braz, professora da aldeia.

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