Cuida! Incidência Amazônida pelo Clima
Incidência política, ou advocacy, é uma ferramenta essencial na luta por direitos. Nos territórios muitas vezes não é exatamente assim que essa prática é nomeada, mas sempre esteve presente o entendimento de que é preciso cobrar dos governos, parlamentos e outras autoridades, por políticas públicas efetivas que garantam dignidade e melhores condições de vida sobretudo no cenário que vivemos de emergência climática.
“A gente vive um movimento de fortalecimento da nossa autoestima nesse processo de incidência, principalmente na Amazônia. A incidência é feita não só dentro dos nossos territórios, mas principalmente fora dele para mostrar mais ainda as nossas identidades plurais e quem são as pessoas protagonistas”, defende Alícia Miranda, de 25 anos, do coletivo Utopia Negra, membro do coletivo Movimento Plantaformas.,
É na linha de pensamento de Alícia que o programa Vozes pela Ação Climática Justa (VAC), em parceria com o Observatório do Clima, reuniu em Brasília 38 jovens e mulheres dos nove estados da Amazônia Legal, para a formação Cuida: Incidência Amazônida pelo Clima. “A solução em geral está nas novas gerações. O caminho é colocar na juventude todo esse conhecimento sobre a questão ambiental, sobre a questão climática e sobre os problemas sociais da região amazônica”, ressaltou Sueli Araújo, do Observatório do Clima, que ministrou o bloco “A incidência como ela é – Executivo, Legislativo e Judiciário”.
Além de Sueli, a programação também abordou os temas: “Justiça Climática e Racismo Ambiental – A realidade dos efeitos da mudança climática nas populações mais vulnerabilizadas e como incidir” com Andreia Coutinho (CBJC) e Angela Mendes (Comitê Chico Mendes); “Mudanças Climáticas na Amazônia – O quadro das causas e efeitos da ação humana no Bioma e sua relação com o Clima no mundo” com Ane Alencar (IPAM/OC); “Eleições Municipais e Clima”, com Sarah Darcie, do Clima de Eleição; e uma roda de conversa sobre incidência internacional conectada aos territórios, com Sineia do Vale Wapichana, presidente do Comitê Indígena de Mudanças Climáticas (CIMC) e co-presidenta para América Latina e Caribe do Caucus Indígena, o Fórum Internacional de Mudanças Climáticas dos Povos Indígenas.
“Queremos contribuir com mais conhecimento sobre a questão climática em si para municiar os movimentos que estão lá no território a agirem de uma forma mais robusta, a conseguirem resultados mais efetivos, para conseguirem fazer propostas e pautar demandas mais elaboradas”, afirma Sueli Araújo.
Cuida! no Poder Executivo
O encontro também promoveu visitas a órgãos do poder público na capital federal. Nos reunimos com a equipe do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) para apresentação e diálogo sobre o Plano Clima – Adaptação, a estratégia do país para promover a redução das vulnerabilidades à mudança do clima e realizar uma gestão dos riscos. A delegação do Cuida foi recebida por Inamara Melo, coordenadora-geral de adaptação à Mudança do Clima do MMA. “Todos os modelos climáticos convergem para a constatação de que a mudança do clima já é uma realidade. Esses impactos são muito reais e severos. Um momento como esse é absolutamente necessário e faz a gente refletir sobre a nossa atuação e a nossa capacidade de lidar com os problemas. É muito importante ter espaços de colheita com vocês”, afirmou Inamara.
Após a apresentação do Plano Clima e do processo que envolve sua construção, os participantes se manifestaram em plenário e posteriormente foram divididos em três grupos com as equipes setoriais envolvidas no Plano Clima Adaptação: povos e comunidades tradicionais, povos indígenas e periferias urbanas. “É preciso que a gente fortaleça a participação das pessoas que foram historicamente excluídas dos espaços de tomada de decisão. Temos que criar oportunidades para que essas pessoas possam ocupar os espaços que estão tomando as decisões que afetam suas vidas sobre diversos temas, mas neste contexto falamos a respeito das ações climáticas de adaptação, mitigação e de resiliência climática”, diz Rogenir Costa, ponto-focal do VAC no Brasil.
Rener Rabelo, do Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM) reforçou a importância da participação popular na construção de políticas públicas, mas pontuou:
“Não adianta pensar e fazer um plano perfeito, com todas as metas, se no final o próprio governo continua autorizando a entrada dos grandes projetos nos territórios. Sabemos que [a mudança climática] não é natural; é antrópica, e sabemos quais são as causas. Um projeto de mineração, de hidrelétrica, é o que torna as pessoas vulneráveis. O próprio governo não escuta as comunidades e depois autoriza os empreendimentos”.
Muitos jovens visitaram esses espaços de poder pela primeira vez, como é o caso de Alícia. “Talvez daqui uns 10 anos a gente tenha uma perspectiva um pouco melhor de como as pessoas se sentem nesses espaços de tomada de decisão. Eu espero que em algum momento futuro a gente consiga se sentir não só pertencente, mas sentir que é um espaço que a gente também possa ocupar”, conclui Alícia.
Já Sayonara Adinkra, do Movimento Plantaformas chamou atenção para a efetividade dos métodos de participação. “É necessário uma verdadeira campanha de comunicação, divulgação e educação sobre o que se trata o processo do Brasil Participativo e o Plano Clima que está ocorrendo pela internet para colher propostas da sociedade. Não dá para falar que este plano é participativo por conta de um link disponível na internet aberto a contribuições e propostas da sociedade”.
Legado vivo de Chico
O segundo dia do Cuida começou com a nossa delegação colorindo o auditório Freitas Nobre da Câmara dos Deputados, durante a “Homenagem a Chico Mendes, Memória Viva, Luta Presente!” A solenidade começou com a abertura de Angela Mendes, presidenta do Comitê Chico Mendes, que faz parte da Coalizão Rede Comunicativa de Jovens.
“Se dizemos que Chico Vive, ele também faz aniversário de vida, já que suas ideias e as sementes que ele lançou continuam vivas e algumas estão aqui. São sementes da Aliança dos Povos da Floresta, nesse contexto rebatizada de Aliança das Amazônias, representada aqui por jovens indígenas, ribeirinhos, quilombolas e extrativistas. E como na carta que meu pai escreveu, esses jovens que estão aqui representam também uma juventude revolucionária. Então, através deles, entrelaçamos dois legados de Chico, sua carta aos jovens do futuro e a aliança que ele firmou com Ailton Krenak, entre extrativistas e povos indígenas”, disse Angela.
A homenagem contou com a presença dos deputados federais Chico Alencar (PT/RJ), Nilton Tatto (PT/SP), Célia Xakriabá (PSOL/MG), Talíria Petrone (PSOL/RJ) e Socorro Neri (PP/AC), além do presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho. Mas o destaque foram as falas inspiradas da juventude, como Samsara Nukini, que faz parte da campanha Aliança das Amazônias. “A gente traz o legado dessas pessoas que já morreram ou foram assassinadas pelo nosso território, que graças a esses defensores hoje ainda se mantém de pé. Mas a gente ainda tá em luta por demarcação de terra. A gente ainda é ameaçado e não é fácil se colocar na linha de frente”, contou emocionada.
Além de Samsara, a mesa da sociedade civil também foi formada por Catia Santos e Marciana Moura, do Coletivo Varadouro; Zezé Weis, da revista Xapuri Socioambiental; Karla Martins, da Casa Ninja Amazônia; e Ana Luiza de Lima, Coordenadora-geral do Comitê Chico Mendes. Todas estas vozes ecoaram os sentimentos de amor, reconhecimento e responsabilidade frente ao legado construído pelo homenageado, o patrono nacional do meio ambiente.
A formação se estende até novembro com módulos online e um encerramento presencial para qualificar ainda mais a compreensão sobre as mudanças climáticas, racismo ambiental, ameaças e soluções baseadas na natureza. O Cuida! é realizado pelo programa VAC em parceria com o Observatório do Clima. Desde 2021, o VAC atua no fortalecimento e protagonismo de jovens e mulheres na agenda climática e na ocupação dos espaços de decisão. O Time Regional de VAC no Brasil é composto por WWF-Brasil, Fundación Avina, Hivos, Instituto Internacional de Educação do Brasil (IEB) e Fundo Casa Socioambiental e apoia mais de 80 organizações com atuação na Amazônia Legal
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FONTE: WWF BRASIL