Brasil não vai reconhecer presidente da Venezuela sem atas eleitorais, diz Amorim
O assessor-chefe especial da Presidência da República, Celso Amorim, voltou a cobrar nesta quinta-feira (15) a divulgação das atas das eleições presidenciais na Venezuela. Em audiência pública da Comissão de Relações Exteriores (CRE), o diplomata afirmou que o governo brasileiro só vai reconhecer o resultado da votação após a publicação dos documentos que confirmam os totais de votos para cada candidato.
De acordo com o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) venezuelano, o presidente Nicolás Maduro foi reeleito para um terceiro mandato com 51,95% dos votos. O candidato da oposição, Edmundo González Urrutia, recebeu 43,18%. A Organização dos Estados Americanos (OEA), os Estados Unidos e a União Europeia não reconhecem o resultado e pedem a divulgação das atas eleitorais. Segundo Celso Amorim, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva demonstrou já “impaciência” pelo atraso na publicação dos documentos.
— Já está muito clara a impaciência do presidente Lula com relação à demora das atas. Isso é evidentemente uma preocupação. Estamos chegando a um ponto em que é preciso sentir uma evolução real. Tenho dito isso e repetido. O presidente Lula já disse. O Brasil não reconhecerá um presidente que não esteja fundado nas atas — afirmou.
Ultimato
Senadores governistas e da posição cobraram a definição de um prazo para que o Brasil se posicione sobre a eventual reeleição de Nicolás Maduro, no poder desde 2013. A senadora Tereza Cristina (PP-MS), que propôs a audiência pública, afirmou que a Venezuela atravessa “um quadro absurdamente antidemocrático”.
— Desde o início do processo eleitoral, a oposição foi reprimida violentamente. Na prática, temos Maduro dizendo que é o vencedor. Mas por que não aparecem essas atas? O mundo está esperando há quantas semanas? Quais serão os próximos passos do Brasil? Quanto mais tempo levarmos para uma decisão, mais difícil ela vai ficar para nós — afirmou.
O senador Humberto Costa (PT-PE) também cobrou uma definição do governo brasileiro.
— Não se trata de estabelecer qualquer tipo de ultimato. Mas o Brasil tem que ter a previsão do que vai acontecer. Até quando vamos aguardar a entrega dessas atas? E se elas não forem entregues? Quais serão as consequências? Vamos abrir um debate para a construção de algum tipo de entendimento político? — questionou.
Celso Amorim preferiu não estabelecer uma data-limite para a divulgação das atas eleitorais pelo governo venezuelano. Para o assessor-chefe especial da Presidência da República, “a impaciência não é boa conselheira”.
— Vamos encontrar uma solução democrática, eleitoral e pacífica. Aprendi que na diplomacia não se estabelecem prazos. Eles podem até ser usados em alguns momentos, mas não são verdadeiros. São apenas um estímulo para que as coisas possam acontecer. Não adianta nada fazer um prazo hoje e, depois de amanhã, descobrir que as coisas estão evoluindo, mas vão tomar mais tempo — disse.
Celso Amorim disse ter questionado diretamente Nicolás Maduro sobre a divulgação das atas eleitorais. O encontro com o mandatário ocorreu um dia após o pleito. Segundo o embaixador, o presidente venezuelano afirmou que os documentos seriam apresentados “nos próximos dias”, o que não aconteceu.
O assessor-chefe especial da Presidência da República negou que o Brasil tenha defendido a realização de novas eleições na Venezuela. Para Celso Amorim, que recebeu o candidato oposicionista Edmundo González Urrutia na Embaixada do Brasil em Caracas, o papel da diplomacia brasileira é promover o diálogo entre a sociedade venezuelana, que ele classificou como “muito dividida”.
— Todos os nossos interlocutores concordam que a prioridade é encontrar uma forma de pacificar o país, que já sofreu com tanta instabilidade. Somos favoráveis à solução que venha do diálogo. É difícil, mas tem que ser tentada. Para explorar o caminho da negociação, temos que manter capacidade de diálogo com todos os envolvidos — disse.
Transparência
O presidente da CRE, senador Renan Calheiros (MDB-AL), disse durante a audiência pública que “a transparência é um componente indissociável da legitimidade de qualquer pleito”.
— A eleição na Venezuela está sendo observada de perto por todo o mundo democrático. Há múltiplos questionamentos, especulações, contestações, lacunas e, sobretudo, uma opacidade que não colabora em nada passa dissipar as dúvidas levantadas mundo afora — afirmou.
O senador Sergio Moro (União-PR) disse que Nicolás Maduro enfrenta denúncias de violações aos direitos humanos, prisões arbitrárias, tortura e desaparecimentos forçados. O parlamentar cobrou de Celso Amorim uma posição do governo brasileiro.
— O senhor protestou junto ao governo Maduro, de maneira formal ou informal, contra essas detenções arbitrárias? Como o senhor consegue conciliar esse desejo pela paz com esse tipo de política que tem sido adotada por Maduro? — questionou.
Em resposta, Amorim condenou os casos de violação aos direitos humanos.
— Eu condeno pessoalmente. Acho um erro. Isso não deveria estar acontecendo. Tenho a impressão de que isso está ocorrendo como uma espécie de ameaça. Mas a função do Brasil é apaziguar, encontrar uma solução pacífica — afirmou.
“Regime de exceção”
Parlamentares governistas e da oposição também se manifestaram contra ameaças ao regime democrático na Venezuela. O senador Dr. Hiran (PP-RR) disse que o governo de Nicolás Maduro “causa muito sofrimento”.
— Não existe democracia na Venezuela. Precisamos ter uma posição mais enérgica. É o maior êxodo humano do nosso século. Um país que causa esse dano inominável aos seus nacionais não pode ser reconhecido por nós, que somos exemplo de acolhimento, democracia e tolerância — afirmou.
O senador Randolfe Rodrigues (PT-AP) classificou o governo de Nicolás Maduro como “um regime de exceção” e disse que as instituições democráticas no país “foram rompidas”. Ele afirmou, no entanto, que os parlamentares não devem tolerar ameaças antidemocráticas — sejam na Venezuela ou no Brasil.
— Sejam malditas todas as ditaduras, de direita ou de esquerda. Encher ministérios de militares sem critério e entregar empresas estatais para alguns militares é condenável na Venezuela e aqui. Prometer violência caso seja retirado do poder é condenável na Venezuela e aqui. Não aceitar derrota em caso de eleição é condenável na Venezuela e aqui — afirmou.
A audiência pública contou ainda com a participação dos senadores Augusta Brito (PT-CE), Damares Alves (Republicanos-DF), Esperidião Amin (PP-SC), Nelsinho Trad (PSD-MS), Rosana Martinelli (PL-MT) e Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB). As eleições na Venezuela devem ser tema de outra audiência pública, ainda sem data marcada. Os parlamentares também devem ouvir o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira.
Fonte: Agência Senado