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Essa é do João

No dia canônico dedicado a São João Paulo II, o primeiro papa não-italiano após 450 anos de hegemonia romana no sucessor de Pedro, 22 de outubro passado, acordei recordando que o polonês Karol Jozef Wojtyla recebeu a notícia de que chegara a bispo após concluir uma prova de canoagem, na Polônia. Ali começaria a sua jornada exitosa como liderança católica, pois na sucessão de progressão, passou de bispo para arcebispo, de cardeal a papa. Em outubro de 1978, Wojtyla foi eleito papa e em seu diário, ‘Estou nas mãos de Deus’, o religioso dedicou só uma página para relatar em rápidas palavras sua vitória no conclave. Citou mais um amigo acometido por uma doença e concluiu escrevendo em latim ‘Debitor factus sum’, que significa ‘Converti-me em devedor’.

Mas no último 22 de outubro, ao acordar, eu estava bem alheio ao dia dedicado ao santo papa e lembrei da sua grande trajetória de religioso, pois de 1978 a 2005, Wojtyla liderou o povo católico distribuído pelos quatro cantos do mundo. Só vir a saber disso, que era seu dia religioso, horas depois, pois naquela terça-feira, dia 22, me dei conta que logo mais, à noite, iria a uma palestra de um outro João, o escritor João Anzanello Carrascoza, considerado um dos principais autores brasileiros. O Carrascoza é de Cravinhos, ao lado de Ribeirão Preto, estreou na literatura brasileira há 30 anos, em 1994, e tem uma carreira muito frutífera na redação publicitária, na propaganda e no ensino superior.

Chego à biblioteca de Marília quase que no mesmo momento em que o João chegou e, sem perder muito tempo, lhe presenteei com um exemplar do meu primeiro livro de contos, ‘Contos do Japim’, lançado pela Carlini & Caniato, em 2010 – portanto, há quase 15 anos. Havia comprado este exemplar dias antes num sebo em Marília, pagando R$ 7. Não tenho mais exemplares do ‘Japim’, então acabo caçando as espécimes remanescentes por aí. O João recebeu com carinho, pediu que autografasse e se dirigiu para nos levar numa autêntica viagem literária.

Embarcamos na Cravinhos da infância de Carrascoza, quando os cafezais ainda rodeavam a cidade e havia um campinho de futebol onde ele jogava bola com os colegas. Avançamos nos momentos da sua infância, essenciais para a sua formação humana, de leitor e, naturalmente, de escritor. Ainda nesta fase da viagem literária, o João mandou essa: ‘Sou escritor por conta da CPFL, a Companhia Paulista de Força e Luz. Sempre brinco dizendo isso. É que na minha infância ocorriam muitos apagões, e a energia demorava a voltar. E, às escuras, ouvia as histórias da minha mãe, os causos dos adultos, e assim, a minha imaginação de escritor começava a florescer’. Cenário mais perfeito para dar asas à imaginação, não há: à luz de vela, família reunida e os pais a narrar histórias, lembranças e suas memórias. O João, brasileiro, nos relatou mais, por exemplo, que seu primeiro prêmio literário foi conquistado em Bauru e que na infância, passava por Marília a caminho de Maracaí e Assis, onde possuía familiares. O João, polonês celebrado no dia da visita do brasileiro, para mim, relata humildade e amor ao próximo. Mas no dia 22 de outubro quem ganhou conclave ou prêmio literário fui eu, pois acabei sendo presenteado por ensinamentos de dois grandes Joãos.

Ramon Barbosa Franco é escritor e jornalista, autor dos livros ‘Canavial, os vivos e os mortos’, ‘A próxima Colombina’, ‘Contos do Japim’, ‘Vargas, um legado político’, ‘Laurinda Frade, receitas da Vida’ e das HQs ‘Radius’, ‘Os canônicos’ e ‘Onde nasce a luz’, ramonimprensa@gmail.com

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