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Agressão a Ciro Gomes expõe dilema de união das oposições a Bolsonaro

As manifestações foram expressivas, principalmente na avenida Paulista, em São Paulo. Mas a comparação com os atos de Sete de Setembro parece demonstrar maior capacidade de mobilização da militância neste momento do presidente Jair Bolsonaro do que daqueles que se opõem a ele. E um fator parece explicar qual é a dificuldade: para além do inimigo comum, Bolsonaro, as oposições ainda têm dificuldade de deixarem de lado suas diferenças e projetos particulares para se unirem contra o presidente. Um episódio resumiu bem essa dificuldade: as agressões contra o candidato do PDT à Presidência, Ciro Gomes, na Paulista.

Ciro participou do ato de protesto contra o governo e pelo impeachment de Bolsonaro. Nas redes sociais, fez questão de comemorar publicando uma foto dele ao lado de Guilherme Boulos, do Psol, para mostrar a união. Mas o pedetista acabou sendo agredido por manifestantes ligados ao PT e à Central Única dos Trabalhadores (CUT). Alguém tentou jogar uma garrafa contra Ciro e pedaços de pau. A presidente do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PR), considerou a situação “lamentável”.

“Apesar das divergências, a gente está seguindo por um movimento. É óbvio que tem essas questões colaterais. Mas eu acho que temos que mostrar o seguinte: tem uma unidade no comando das forças políticas, das forças sociais e do movimento sindical para que a gente tenha um foco. Nosso inimigo é Bolsonaro”, disse

Guilherme Boulos, que apareceu no ato ao lado de Ciro, também criticou as agressões sofridas pelo candidato do PDT: “Os atos de ontem em todo o Brasil demonstraram força e unidade contra Bolsonaro”, disse ele. “A presença de amplos setores políticos é fundamental para a lusta pelo impeachment. Nesse sentido, a hostilização de lideranças que foram à Paulista, entre elas Ciro Gomes, é inaceitável”.

“Fúria e deselegância”

No domingo, Ciro Gomes postou um vídeo nas redes sociais em que também comenta o episódio. “Fui às ruas em defesa da democracia. E estou muito feliz por isso. Fui com o peito aberto e a coragem que Deus sempre me deu”, disse Ciro. “E sabendo que poderia enfrentar de antemão a fúria e a deselegância de alguns radicais. Os radicais, seja da esquerda seja da direita, nunca me intimidaram. E nunca me intimidarão”, continuou. “Eu não fui às ruas para dar lição a ninguém. Fui, antes de tudo, para dar um testemunho de fé, de humildade e de coragem. Mas fui, sobretudo, para dizer que uma das maiores lições da política é dizer que é preciso se unir acima de qualquer diferença quando se enfrenta um inimigo coletivo, quando se enfrenta um inimigo mortal, um inimigo da vida, um inimigo do povo. Essa luta está apenas no começo. E ela será vitoriosa muito mais rapidamente quando todos aprenderem quem é o verdadeiro inimigo e quem é o verdadeiro alvo”, afirmou o candidato do PDT.

Marina Silva, da Rede, também prestou solidariedade a Ciro Gomes: “É antidemocrática a tática de agressões para tentar intimidar adversários. É um desserviço à democracia instrumentalizá-la para praticar da intolerância e do exclusivismo politico autoritário. Minha solidariedade ao @cirogomes pelas agressões sofridas em São Paulo”.

Na sua conta no Twitter, o presidente Jair Bolsonaro tratou de pontuar a ideia de que as manifestações da oposição, ao contrário daquelas que foram a seu favor, foram marcadas pela violência. Ele mostrou uma foto de um boneco com o seu rosto pegando fogo por ação dos manifestantes. Ao lado, a seguinte mensagem: “Bom dia a todos. – Muita paz e alegria nesse domingo”.

E o senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) postou um vídeo no Twitter no qual compara imagens do ato de Sete de Setembro em Brasília com o de sábado. E escreve: “Esta é a verdadeira pesquisa”.

Para o líder da oposição na Câmara, Alessandro Molon (PSB-RJ), “os atos foram muito importantes”, pela primeira demonstração de união das forças que se opõem a Bolsonaro. “Foram amplos, representativos, e começam a traduzir nas ruas aquilo que as pesquisas de opinião mostram há muito tempo: a maioria absoluta dos brasileiros não suporta mais Bolsonaro e quer o impeachment. Nossa luta pelo afastamento de Bolsonaro sai fortalecida deste 2 de outubro”, considera.

Mas Molon admite: “Muitas pessoas ainda não vão para as ruas pedir o impeachment de Bolsonaro porque o presidente da Câmara, Arthur Lira, tem dito e demonstrado que não pretende deixar o tema avançar. Diante de sua deliberada inércia, muita gente desanima de lutar pelo impeachment. Mas acredito que, com a contínua queda de popularidade de Bolsonaro, a tendência é que a pressão pelo impeachment na sociedade aumente, e as manifestações fiquem cada vez mais cheias”, aposta ele. O líder da oposição, porém, lamenta o episódio com Ciro: “Quanto ao episódio da agressão a Ciro, considero inaceitável e péssimo para o movimento. Não podemos antecipar possíveis futuras disputas eleitorais e permitir que isso nos divida, como também não faz nenhum sentido transformar divergências políticas em agressões físicas”, critica.

O deputado distrital Leandro Grass (Rede) também aponta que a grande lição após os atos é a necessidade de união em torno do adversário comum. “O ato de hoje comprova que sem unidade não superaremos essa fase infeliz da história”, considera ele. “Precisamos convergir abrindo mão das vaidades, dos exclusivismos e do personalismo”, completa.

Dificuldades de união

As dificuldades de união dos que se opõem ao presidente já tinham ficado claras no dia 12 de outubro, nos atos organizados pelos grupos conservadores e de centro-direita que se opõem a Bolsonaro, o Movimento Brasil Livre (MBL) e o Vem pra Rua. Parte da esquerda, especialmente o PT, se recusou a participar desses atos. E, de fato, em muitos lugares, o PT e seu candidato, Luiz Inácio Lula da Silva, acabaram hostilizados por alguns manifestantes com cartazes de “Nem Lula nem Bolsonaro”. Um boneco, na ocasião, mostrava tanto Lula como Bolsonaro vestidos de presidiários.

Nos atos deste sábado (2), uma ausência, porém, continuou percebida, a do principal candidato de oposição, de acordo com as pesquisa. Para o cientista político André Cesar, a ausência de Lula ajudou a diminuir o movimento. “Os atos foram um pouco abaixo do esperado”, considera ele. “Sem Lula, que inteligentemente não quis entrar nessa bola dividida, o movimento não ganha tração”, avalia. “E ficou claro que será muito difícil um entendimento entre as forças políticas de esquerda, de centro e de centro-direita”. Para André Cesar, esse é o maior problema: “As diferenças programáticas e ideológicas falarão mais alto, provavelmente até o primeiro turno das eleições”. O episódio com Ciro Gomes, considera, “além de lamentável intolerância, exemplifica essa dificuldade de entendimento”.

FONTE:CONGRESSO EM FOCO(Por Rudolfo Lago)

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