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A luta de quem vive de perto os efeitos da crise climática

Em depoimento à Camila Doretto.

Rui Gemaque tem 23 anos, nasceu em Belém do Pará e cresceu entre a capital e Ananindeua, o segundo município mais populoso do estado, além de ter vivido parte da infância à beira do Rio Acará, no interior, na casa da avó. Hoje, Rui é estudante de medicina veterinária e trabalha pela conservação do peixe-boi-da-Amazônia, além de ser ativista do grupo de voluntários do Greenpeace em Belém. 

Como ativista, ele atua com educação ambiental sensibilizando crianças, jovens e adultos, “mostrando para eles um mundo novo que, na verdade, sempre esteve ao redor de todos, mas que muitas vezes pode passar despercebido”, como ele mesmo descreve. Em praças de Belém, no Museu de Zoologia da Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA) e em escolas da cidade, ele realiza um trabalho de conscientização sobre como as pessoas devem lidar com situações de risco, como quando animais silvestres entram nas casas, cobras, por exemplo, ou outros que oferecem riscos à saúde humana – contato que ocorre principalmente no período de chuvas. 

Com o objetivo de conectar todo um ciclo que passa pela crise climática, as injustiças sociais e a perda de floresta (a maior contribuição do Brasil para a crise climática), Rui foi convidado pelo Greenpeace Brasil para sobrevoar áreas de desmatamento na região de Porto Velho (RO).

Leia o relato dele a seguir sobre essa experiência.

“Quando a facilitadora do grupo de voluntários em Belém entrou em contato comigo para fazer o convite, eu achei a ideia incrível. Porque uma coisa é a gente falar de conservação de um lugar um pouco distante, sem testemunhar mesmo a tragédia de perto. Outra é ver a queimada acontecendo. Me sinto uma testemunha a mais de toda essa destruição.

A gente que vive na Amazônia tem uma relação que não se separa da floresta, mesmo morando em uma metrópole. Apesar da urbanização, a gente sempre tem as árvores muito presentes, e toda a biodiversidade composta por fauna e flora. 

Com certeza essa experiência do sobrevoo não foi uma experiência rasa. Eu nunca vou conseguir esquecer. E acredito que qualquer pessoa que visse o que a gente viu hoje, com certeza sairia impactado. 

Apesar de a gente escutar sobre desmatamento da Amazônia e sobre as queimadas, é muito diferente quando a gente vê a proporção com a qual esses eventos acontecem. É algo muito chocante, triste, não tem outra palavra pra dizer. Triste e desesperador. 

Se fosse para escolher algo que mais me impactou nesse sobrevoo, eu diria que talvez as imagens. As imagens de uma forma geral. Porque quando eu vi aquilo de cima, eu imaginei a quantidade de bichos desesperados querendo fugir do fogo, da fumaça, os que perderam suas casas, seu alimento, os que morreram porque não conseguiram escapar, sabe? Eu fico imaginando o grande desespero que é a perda da vida por conta das chamas, as chamas chegando e devastando tudo, e saber que toda aquela área não vai se recuperar tão facilmente.

A perda da floresta se relaciona diretamente com a região de onde eu venho. Os impactos da crise climática me fazem pensar sobre as consequências para quem vive em algumas regiões da cidade e convivem com uma série de vulnerabilidades. Primeiro, penso na urbanização, no crescimento desordenado da cidade. Não existe planejamento e a população periférica acaba indo para as beiras da cidade, áreas para onde o poder público virou as costas para direitos fundamentais como o planejamento sanitário, por exemplo. As populações de mais baixa renda, quando têm suas casas invadidas pelas chuvas, são também acometidas por doenças que poderiam ser evitadas se houvesse um melhor controle arquitetônico ou sobre a saúde, pois estão muito mais suscetíveis a dengue, Zika ou malária.

E eu não posso deixar de falar de sobreposição de injustiças também quando penso que apesar da região norte ser uma das maiores produtoras de energia do país é a que paga mais caro por ela. Existe então tanto essa questão grave de injustiça como também da falta de responsabilidade do poder público quanto ao manejo e distribuição justa da água.

E mais, para as construções das hidrelétricas que abastecem a região e outras regiões também são necessárias que grande áreas de floresta sejam desmatadas, sejam inundadas, e boa parte da biodiversidade é dizimada. E o problema é que ainda existem muitos outros projetos que ameaçam a ecologia dos rios, das florestas, ameaçam também a população local, a população quilombola ou ribeirinha, que estão ali nas margens dos rios e que correm o risco de ter que se deslocar para que sua identidade seja sobreposta por projetos econômicos que não levam em consideração essas realidades.

Eu me tornei voluntário do Greenpeace porque queria fazer um pouco mais pelo meio ambiente, para somar forças e combater os retrocessos contra a vida no planeta. A vontade que eu carrego comigo depois dessa experiência é de seguir nessa luta, falando cada vez mais sobre toda essa problemática. E farei isso ainda com mais vontade, principalmente para aquelas pessoas que não têm acesso a esse tipo de informação. E quero falar pra elas também que existe solução e que tudo isso tem relação com as nossas vidas, onde quer que a gente esteja”.

FONTE ; GREENPEACE BRASIL ( POR Camila Doretto)

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