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WWF-Brasil doa 60 toneladas de alimentos para comunidades da Amazônia

Por Fábio de Castro, especial para o WWF-Brasil

Quando a pior seca registrada na história atingiu a Amazônia, em 2023, o WWF-Brasil se mobilizou para apoiar parceiros do território no enfrentamento à crise humanitária na região, pois as consequências da estiagem se mostraram especialmente dramáticas para as populações mais vulneráveis, como indígenas, quilombolas, extrativistas e ribeirinhos. Desde então, a organização doou cerca de 60 toneladas de alimentos para mais de 3.900 famílias em áreas impactadas pelo desabastecimento nos estados do Pará, Amazonas e Rondônia.

“As famílias tiveram um grande alívio, pois em muitos casos realmente não havia mais alimento naquele momento. A ajuda chegou em muito boa hora”, lembra Dioneia dos Santos Pereira, coordenadora do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais (STTR), que representa nove regiões do enorme município de Santarém, no Pará. Ela conta que mais de 15 mil agricultores ligados à instituição foram afetados pela seca e que o grupo espera com apreensão a volta das chuvas neste ano. “Choveu um pouquinho, mas não o suficiente para encharcar a terra. Muita gente plantou a maniva e o milho esses dias, mas a chuva não veio com força, então a planta não consegue ir para frente e morre. Isso compromete a segurança alimentar e estamos preocupados com a fome na região. Queira Deus que não aconteça, mas é preocupante”, diz.

Dioneia pontua que nas regiões de várzea, onde as plantações foram duramente atingidas durante a seca, há dificuldade em restabelecer o cultivo. “A macaxeira, por exemplo, tem um ciclo de seis meses entre o  plantio e a colheita. Muita gente perdeu a plantação porque a chuva não veio. E se a tentativa de replantio é feita muito tarde, a enchente pode começar e impedir a colheita”, afirma. “Também houve mortalidade muito grande de peixes porque as águas esquentaram demais. A dificuldade de transportes era enorme. Algumas pessoas tinham que andar sete quilômetros para conseguir água potável.”

Com cerca de 400 famílias, a comunidade Urumanduba, onde Dioneia vive desde que nasceu, há 49 anos, fica a oito quilômetros da cidade de Santarém. Outras comunidades das regiões de Lago Grande, Arapiuns, Arapixuna, Cumaúma e Chapadão são muito mais afastadas. “As crianças foram especialmente prejudicadas. Elas iam de barco às escolas, mas como secou tudo era preciso andar vários quilômetros. Na região do Arapixuna, as crianças chegavam a caminhar 18 quilômetros a pé, da comunidade de Muacá até Carareacá, onde fica a escola”, recorda.

A estimativa do sindicato é de que a produção da agricultura familiar tenha caído 70% durante a seca. E esse não é o único problema. “Com a morte de peixes, já é alto o risco de insegurança alimentar. Minha comunidade fica à beira do Rio Humaitá e os peixes todos morreram. Algumas pessoas criam gado lá e estão preocupadas porque o pasto agora está seco”, alerta a coordenadora do STTR.

Osvaldo Barassi Gajardo, especialista em Conservação e líder do núcleo de respostas emergenciais do WWF-Brasil, relata que assim que os níveis dos rios da Amazônia começaram a baixar de forma drástica, comprometendo a logística para que os moradores tivessem acesso a produtos e mercados, a organização intensificou a comunicação com parceiros locais. 

“A situação era alarmante. Fizemos uma articulação com os parceiros na ponta, para identificar e priorizar as famílias mais vulneráveis. Então, conseguimos dar uma resposta inicial para apoiar algumas delas que estavam em situação mais crítica. Entre os meses de novembro e dezembro, doamos cestas básicas para quase quatro mil famílias em regiões de Rondônia, do Pará e do Amazonas”, afirma Gajardo. 

Trabalho em conjunto no Pará

No Tapajós, o WWF-Brasil trabalhou com três organizações, a Sapopema (Sociedade para a Pesquisa e Proteção do Meio Ambiente), a Fepipa (Federação dos Povos Indígenas do Pará) e o Cita (Conselho Indigenista do Tapajós), que representa várias comunidades indígenas, para a distribuição de duas mil cestas básicas. 

O WWF-Brasil viabilizou a aquisição dos alimentos, mas a logística para chegar às comunidades vulneráveis foi feita pelos parceiros, em colaboração com algumas prefeituras, o ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade) e outras instituições locais, que forneceram veículos e combustível para as entregas. “Foi uma boa estratégia, que nos permitiu comprar mais cestas básicas e demonstrou a eficácia de um trabalho coletivo, de várias organizações, para atender a uma emergência comum”, pontua Gajardo.

Na Reserva Extrativista Tapajós-Arapiuns, no Pará, ainda estão aparecendo muitos peixes mortos. “A seca fez aumentar a quantidade de capim nas margens dos lagos. Quando a água começou a subir, o acúmulo de capim impediu a migração dos peixes e isso ainda está causando grande mortandade”, alerta Wandicleia Lopes, coordenadora da Sapopema. “Sem peixes e sem plantações, o impacto na segurança alimentar é muito forte não só para as comunidades ribeirinhas, mas também para as populações dos centros urbanos, pois os mercados deixaram de ser abastecidos por esses produtos”.

Moradora da comunidade de Boca de Cima do Aritapera, região de várzea do município de Santarém, Maria Zulma Lopes Monteiro conta que o principal impacto deixado pela seca foi o acesso à água potável. “As chuvas ainda estão fracas, mas os rios encheram um pouco, o acesso melhorou e na maioria das comunidades já é possível ir ao centro de Santarém de barco. Mas a água ainda não está boa para o consumo. O capim que se acumulou durante a seca apodreceu e comprometeu a qualidade da água”, afirma.

De acordo com Maria Zulma, o apoio humanitário foi fundamental na região. “Tivemos uma ajuda do WWF-Brasil, que foi muito importante para as famílias que perderam sua produção ou nem conseguiram produzir. As dificuldades foram imensas para os moradores, principalmente para os agricultores”, lembra.  “Quem conseguiu produzir acabou perdendo tudo por não ter acesso ao transporte para escoar a produção. Foi muito difícil. Sou nascida e criada nessa comunidade e nunca vi seca igual à do ano passado. Foi o pior ano que já vi”, conclui.

Apoio em Rondônia e no Amazonas

Em Rondônia, foram apoiadas comunidades seringueiras da área do Rio Madeira e da Reserva Extrativista do Lago Cuniã, em uma parceria com a Associação de Defesa Etnoambiental Kanindé e a Organização dos Seringueiros (OSR). Nessa região, as famílias vivem da pesca e houve muita mortandade de peixes, com rios secos e grande dificuldade de acesso. Ali, 500 famílias de mais de 10 comunidades receberam 500 cestas básicas. 

Já por meio da Aliança para o Desenvolvimento Sustentável do Sul do Amazonas, que reúne dez municípios da região, o WWF-Brasil doou 1.200 cestas básicas. A expectativa é de que outras 500 ainda sejam entregues nas próximas semanas. Nessa mesma região, a organização já havia doado à associação APADRIT, da Reserva Extrativista Ituxi, 103 cestas. “Apoiamos também a Reserva de Desenvolvimento Sustentável Piagaçu-Purus, com 120, em parceria com a Secretaria do Meio Ambiente do Estado do Amazonas”, diz Gajardo.

Embora no Sul do Amazonas a seca já tenha terminado, a população continua enfrentando seus impactos. “Na maior parte da região, a chuva já voltou com força. Agora as comunidades estão com medo da alagação, mas já prevendo que podem ser atingidas novamente por uma seca severa”, relata Josimar Silva, secretário-executivo da Aliança. “Tivemos comunidades que sofreram mais e outras menos. Algumas ficaram isoladas, outras perderam as plantações e muitas pessoas que ficaram doentes por causa da água escassa e contaminada”.

Silva afirma que os moradores do Sul do Amazonas se referem à última seca como “a maior estiagem de todos os tempos”. “Isso mostra a influência das mudanças climáticas acontecendo. Agora, no tempo presente mesmo, não são mais previsões e sim acontecimentos que se desenrolam diante dos nossos olhos”, reforça.

Outras frentes de atuação do WWF-Brasil

Além de prejudicar boa parte da população, que ficou isolada e com dificuldades de acesso a itens básicos como comida e água potável, a seca extrema de 2023 também castigou a fauna. O caso mais dramático foi a morte de pelo menos 300 botos cor-de-rosa (Inia geoffrensis) e tucuxis (Sotalia fluviatilis), nos lagos Tefé e Coari, no interior do estado do Amazonas. 

Desde que as primeiras carcaças foram identificadas, em setembro de 2023, o WWF-Brasil tem atuado em parceria com as forças-tarefas lideradas pelo Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá e pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, fornecendo combustível, Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), insumos veterinários e apoio logístico para o deslocamento de voluntários. 

Assim como dando suporte no planejamento e mapeamento de áreas sensíveis aos animais, utilizando inclusive modelos climáticos. A expectativa é de que ainda no primeiro semestre deste ano seja realizado um workshop com especialistas de todas as organizações parceiras para discutir os aprendizados trazidos pela crise de 2023 e estabelecer protocolos para evitar e mitigar eventos semelhantes no futuro próximo.

Em outra frente, o WWF-Brasil intensificou doações de equipamentos para brigadas de combate ao fogo, especialmente em assentamentos e comunidades ribeirinhas e indígenas, devido às queimadas que ocorreram na Amazônia por conta da estiagem. Em dezembro de 2023, foram apoiadas três brigadas, duas no Tapajós e uma no Amazonas. E esse trabalho continua em 2024.

A organização doou cerca de 60 toneladas de alimentos para mais de 3.900 famílias em áreas impactadas pelo desabastecimento no Pará, Amazonas e Rondônia

FONTE: WWF BRASIL

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