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Aos 80 anos, Dori Caymmi flerta com a leveza no álbum ‘Prosa & papo’ sem se afastar do ‘mundo de dentro’ do artista

Álbum que Dori Caymmi lança amanhã, 12 de abril, Prosa & papo apresenta safra menos inspirada de canções no confronto com os repertórios dos discos anteriores do compositor carioca de 80 anos.

Nem por isso, Prosa & papo deixa de ter grandes atrativos e sutis diferenças em relação aos cinco densos últimos álbuns – Inner world / Mundo de dentro (2009 / 2010), Poesia musicada (2011), Setenta anos (2014), Voz de mágoa – Música do Brasil (2017) e Sonetos sentimentais para violão e orquestra (2022) – da discografia solo do artista carioca.

A sutil diferença reside no fato de que há certa leveza em músicas como o samba Chato (gravado por Dori com João Cavalcanti), o samba-canção Um carioca vive morrendo de amor – ode feita por Dori à cidade natal do Rio de Janeiro em gravação com Joyce Moreno (perfeita tradução da bossa carioca), MPB4 e Zé Renato – e na composição que batiza o disco, Prosa & papo, letrada por Paulo César Pinheiro tendo como mote expressão (‘Carrapixo é mato, carrapato é bicho’) cunhada por Dorival Caymmi (1914 – 2008), pai de Dori e dono de cancioneiro matricial que partiu da Bahia e veio dar no mar carioca.

Por ter certa dose de urbanidade, o álbum Prosa & papo está menos embrenhado nas matas, mares e rios que banham a poesia musicada de Paulo César Pinheiro, autor das letras de nove das 11 músicas do álbum, mas não se afasta desse universo poético.

As duas exceções são as letras escritas por Roberto Didio para Evoé, Nação! – celebração do Brasil musical de Ary Barroso (1903 – 1964), festival, Geraldo Vandré, Pelé (1940 – 2022) e Tom Jobim (1927 – 1994), entre tantos outros grandes nomes mencionados nos versos da letra que evoca Paratodos (1993) de Chico Buarque – e para Canto para Mercedes Sosa, tributo à cantora argentina Mercedes Sosa (1935 – 2009), voz de resistência da América Latina.

Ambas as faixas têm o reforço de vozes imponentes. Convidado do réquiem para a artista argentina, Renato Braz carrega na voz o sangue quente mencionado na letra em homenagem a Mercedes. Já Evoé, Nação! junta o canto de Dori com as vozes límpidas de Joyce Moreno e Mônica Salmaso, com quem Dori gravou álbum lançado há dois anos, Canto sedutor (2022).

A propósito, três músicas desse disco com Salmaso – A água do rio doceRaça morena e a composição-título Canto sedutor – ganham registros individuais de Dori em Prosa & papo, se juntando no repertório a oito músicas inéditas.

Da safra autoral inédita de Dori com Pinheiro, o baião Três moças desloca o disco para universo nordestino. Já Saia de renda gira no ritmo das cirandas praieiras com a brasilidade entranhada naturalmente no cancioneiro de Dori Caymmi e Paulo César Pinheiro.

No fecho do álbum, Canção partida – gravada com adesões de Ana Rabello no cavaquinho e de Julião Pinheiro no violão de sete cordas – embute a tristeza e a densidade que permeiam o mundo musical de Dori Caymmi – mundo de dentro que nada tem a ver com o humor ranzinza do artista no convívio social.

“Todo cantor que canta tem vontade de chorar”, sentencia Dori na faixa, com a voz de mágoa sublinhada pelo toque seresteiro do violão de Julião.

Sim, o canto de Dori Caymmi parece querer chorar e fica mais sedutor quando adentra o rico mundo interior do grande cantor, compositor e arranjador octogenário.

FONTE:G1 (POR MAURO FERREIRA)

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